Este artigo nasceu da
experiência de compra de um shampoo no super-mercado, em minhas cotidianas
compras de mês. Sim, compra-se shampoo em super-mercado e não é de hoje. Há
algum tempo, os super-mercados entenderam que a gente não quer só comida. A
gente quer comida, produtos de limpeza, de higiene pessoal, artigos para pet,
revistas, pilhas, diversão e arte. Quando eu era criança, comprava-se shampoo
apenas na farmácia.
O fato é que eu andava
pelo corredor de produtos de higiene pessoal e, insensível às dezenas de
informações que nos assediam em ambientes como este, informações como “compre
este”, “não, compre este aqui”, “não, este aqui dura mais”, ou “ei, veja como
este é mais barato”; fui tocado. Meus olhos brilharam, senti um calafrio, uma
emoção, uma esperança: shampoo três em um. Um sonho. É shampoo e condicionador,
é sabonete líquido para banho e é creme de barbear. Embalagem atraente,
ergonômica (os dedos se encaixam na cintura da garrafinha) e luxuosa, um
exagero para transportar apenas 250 ml de sabão. Mas aquele não era um simples
sabão: era uma poção mágica para homens exigentes e de bom gosto, que prezam
pela praticidade da vida, e que têm de investir seu tempo em grandes negócios,
em romances de tirar o fôlego e no futebol do fim de semana. Pensei: isso é
para mim! Esse sou eu! (Quem dera.) Comprei. R$ 11,93, etiqueta vermelha,
promoção de lançamento.
Na verdade o que me
interessou mesmo foi a conveniência de, em viagens, levar um produto apenas, no
lugar de ter de levar um shampoo, um condicionador, uma lata de espuma de
barbear e uma saboneteira. Para quem passa um quarto do ano em hotéis (dos mais
variados padrões, desde hotéis realmente bons a hotéis classificação
“toalha-lixa, se quiser”), para mim, um produto como esse era conveniente.
Antes de colocá-lo na
mala, decidi testá-lo em casa, na véspera da próxima viagem. E que tragédia.
Era bom demais para ser verdade. Liguei o chuveiro, liguei o som (sim, eu ouço
música no banho e, quando inspirado, canto junto), e quando a fumaça levantou,
entrei. O perfume era gostoso, mas logo notei que a espuma custava a se formar.
O cabelo depois da lavagem virou palha de milho. O sabonete líquido, para
cobrir de espuma meus parcos 1m74 e 72 kg, exigia um quinto daquela garrafinha.
E o barbear foi uma verdadeira carnificina. Isso porque a lâmina já estava
amaciada. Fosse uma lâmina nova, e eu teria cortado minha jugular. Foi um
desastre. A verdade é que, racionalmente, é impossível uma mesma solução servir
para tudo ao mesmo tempo. O mundo dos especialistas é sempre mais rico e
virtuoso do que o dos generalistas. Senti-me ofendido, desesperançado,
frustrado e ferido. Eles poderiam ter me avisado: “este é um 3 em 1 para homens
que não querem levar muita bagagem e que não fazem muita questão de um cabelo macio
e de um barbear rente e confortável. Escolha: praticidade sem caprichos ou
bagagem pesada.” Não é meu caso. Eu, tivesse sido avisado, teria dito “não,
obrigado”. Resignado, voltei à minha nécessaire
com 32 itens, pesadinha, de couro imitação.
A lição que se tira
deste artigo? Boa pergunta. Algumas, talvez. Prometa e cumpra, seja honesto em
suas propostas (o que não significa deixar de ser ambicioso), e, se vender
ilusões, entregue-as. Faça como os mágicos. Venda ilusões, e entregue-as com
nota fiscal. Um cliente frustrado não gera novos negócios. Gera, nesta era de
conectividade social em rede, diária e simultânea, má reputação. Eu aprendi
ainda uma outra coisa: a grande invenção do homem não foi a roda, a luz
elétrica, a arquitetura ou a medicina. Foi a espuma de barbear sensitive skin.
* Palestrante Eduardo Peres – Palestrante, mágico e
humorista, especialista em vendas, liderança e motivação de equipes para
resultados. Foi Campeão Mundial de Mágica em 2000.