terça-feira, 28 de abril de 2015

Liderança e chefia: o falso dilema


   É verdade que muito já se escreveu sobre liderança, mas o assunto jamais se mostra esgotado pela subjetividade de suas definições.            

   Nesta chamada literatura de negócios, o termo “liderança” é palavra-tema comum. E com o passar dos anos e a popularização desta específica literatura, alguns clichês se estabeleceram como "verdades absolutas", como por exemplo a falsa equação de discordância entre os termos "chefe" e "líder", e seus respectivos significados.

   Ora, "chefe" e "líder" não devem ser termos antagônicos. Eles não são antônimos. Pelo simples motivo de não terem absolutamente nenhuma ligação entre si.

   Em poucas palavras, "chefe" é um termo ligado à ideia da organização de uma  hierarquia. E não há nada de errado ou de negativo com isto. A ideia de hierarquia denota a ideia de organização de responsabilidades (empresarial, militar, familiar ou qualquer que seja), e organizações (mesmo as democráticas) usualmente praticam o modelo hierárquico como adequado e produtivo.

   E "líder" é a denotação de uma habilidade, isto é, o pressuposto de um indivíduo que detém o atributo da liderança.

   Isto quer dizer que um líder não precisa ser necessariamente um chefe. (E que a liderança portanto está ao alcance de todos por ser esta um atributo pessoal, uma habilidade, um estado de espírito, uma vocação desenvolvida.) E que um chefe propriamente dito pode ou não ser um habilidoso líder. Em suma, porque liderar significa dar norte, inspirar, animar, motivar, entusiasmar, cativar, influenciar. E isso pode partir da chefia ou não.

   Portanto, não confundir (ou contrapor) chefia com liderança. Em duas palavras, meu chefe pode ou não ser meu líder. E meu líder (aquele que me inspira, influencia, cativa, anima, motiva e dá norte aos meus pensamentos e ações) pode ou não ser meu chefe. Ele pode ser inclusive meu subordinado, meu irmão mais jovem ou meu filho, meu aluno, meu discípulo.

   Como conclusão, seja ou não seja você um chefe (em qualquer modelo hierárquico constituído: empresarial, familiar, militar etc.), desenvolva o atributo, a habilidade, o "estado de espírito" da liderança sendo o porta-voz de uma causa pública virtuosa. Basicamente, líder é aquele que não pensa apenas em si. Se a sua ideia, causa ou proposta forem boas para qualquer coletividade específica (ou para uma única pessoa que seja), você encontrará seguidores. E conquistará a lealdade e a confiança dessas pessoas. E não apenas a sua obediência.



* Eduardo Peres é mágico, humorista e palestrante para treinamento motivacional. Foi Campeão Mundial de Mágica em 2000. www.eduardoperes.com.br.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

A inimizade do executivo com o intelectual


         Esse artigo pretende brevemente refletir sobre a conciliação de duas facetas tão distintas mas imprescindíveis a homens e mulheres de negócios (ou pelo menos àqueles que se pretendem inovadores e prósperos): as facetas do executivo e do intelectual.

     Marilena Chaui, quando perguntada no programa de entrevistas Roda Viva em 1989 sobre se era possível conciliar a executiva com a intelectual, respondeu brevemente: “Não, não é possível”. O caso de Marilena é emblemático. Intelectual conhecida, filósofa, escritora e professora da USP, Marilena tem extensa e importante obra literária publicada, (além de inúmeras contribuições em simpósios, conferências e palestras em ambiente acadêmico, especulando sobre filosofia e militância política), o que naturalmente exigiu-lhe dedicação para a ampla pesquisa e o mero ato de se sentar para escrever. Ocorre que em 1988, a então prefeita eleita de São Paulo Luíza Erundina a convidou para assumir a Secretaria de Cultura. Marilena aceitou, e tornou-se portanto, pelo menos naquele momento, uma executiva. É dever do executivo, sabemos, nomear e gerenciar equipes, idealizar e planejar o futuro, delegar missões (ou simplesmente tarefas), gerenciar os acontecimentos (ou os não-acontecimentos) ao longo do tempo por parte de sua equipe, corrigir as rotas que eventualmente estejam equivocadas, cobrar, incentivar, reconhecer e motivar sua equipe, fazer acontecer o que se planejou. Em suma, uma rotina e um modelo mental radicalmente diferentes da rotina do intelectual. O intelectual, por sua vez, dedica-se ao “ócio”, isto é, à reflexão. Lembremos que “negócio” vem de “negação do ócio”: quando fazemos “negócio”, negamos a nossa condição momentânea de intelectuais e somos executivos. Quando nos dedicamos ao “ócio” (momentos de serenidade para a reflexão, que em nada tem a ver com a ideia de descanso descomprometido), a figura do intelectual se sobrepõe à outra. Basicamente conclui-se que de fato não há como conciliá-las.

            Pois: uma carreira bem sucedida exige de nós o muito. Que sejamos reflexivos para sermos criativos e inovadores – que tenhamos ideias e conceitos próprios no que se refere à nossa condição de formuladores do pensamento: que sejamos intelectuais. E exige-nos também a capacidade executiva, isto é, o poder de realização, a capacidade de planejar e a disciplina e a competência para fazer acontecer. Está dado o desafio: conciliar essas duas facetas.

            A conclusão à qual cheguei, meramente pessoal, mas que aqui divido com aqueles que possam vir a se interessar: para manter em alto nível as duas vertentes, nada como a disciplina da agenda. Uma vez na semana, (normalmente às sextas-feiras, mas nem sempre), quando em São Paulo, a “agenda de trabalho”, de manhã à noite, é a dedicação plena ao estudo, à pesquisa, à leitura de largo fôlego. Para isso, é preciso “renunciar ao escritório”, isto é, delegar o que se pode delegar e assumir a ausência sem culpa. Desta maneira, as leituras avançam, a pilha de livros “a examinar” diminui e se renova, as novas ideias ocorrem e o vigor para a volta à lida executiva se apresenta especialmente. Muito negócio e pouca leitura não faz bem para o negócio. A leitura dedicada (não necessariamente apenas em temas ligados diretamente ao negócio, mas especialmente àqueles que aparentemente em nada têm a ver), como parte da agenda, por sua vez, além da alegria de viver profunda que proporciona, faz e muito bem para os tais negócios.



* Eduardo Peres é mágico, humorista e palestrante para treinamento motivacional. Foi Campeão Mundial de Mágica em 2000. www.eduardoperes.com.br.



quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Significado



            Abra a janela. Ouça o barulho terrível da cidade em desespero. Agora feche. Silêncio total. Esse é o silêncio que você comprou. Não, você não comprou uma "janela anti-ruído". Você comprou silêncio. Mais do que isso: comprou produtividade, sossego, sono de melhor qualidade, comprou saúde. Sim, prevenção de stress, que pode lhe gerar um ataque cardíaco e lhe abreviar a existência. Você comprou sobrevida! Esses três maços de cigarro diários que você fuma vão lhe abreviar a vida? Não se preocupe. Essa "janela anti-ruído" compensará este seu hábito insalubre. E aquele suco de caixinha sobre aquela mesa. Tão mais caro que um suco de caixinha de marca qualquer. Mas esse tem "gominhos de laranja como o suco da fazenda". Sim, você não tem uma fazenda, mas pode se sentir um mega-investidor do agronegócio em um fim de tarde bebendo um suco "com gominhos de laranja como feito na fazenda". Logo ao lado dele, em momento oportuno, prove aquele chá mate também de caixinha, caixinha essa marrom, porque ali diz que é o "chá mate com carinho da vovó". Que coisa gostosa. Isso não é uma bebida. É praticamente um carinho. Aquele pacote de folhas de sulfite tem "o branco que lhe inspira as ideias". E o aviso grudado na parede do banheiro de hotel lhe recomenda usar a mesma toalha "para salvar o planeta". Exatamente como aquele pacote de maizena. Ele diz, em letras verde-e-amarelas "Maizena no ritmo da Copa!". Como? Sim, não precisa fazer muito sentido. Amido de milho no ritmo, no pique, alegria. E a Copa, o hexa, o Neymar. A Copa passou, mas a Maizena só vence em setembro de 2017. A caixinha venceu antes, ainda no primeiro tempo, no terceiro ou no quarto gol.


            O mundo dos negócios - dos produtos, dos serviços, das imagens institucionais, da política, dos relacionamentos, do que quer que seja - é a rigor o mundo das ideias. Do significado. Do espírito. Do conceito. Do que está por trás ou para além do material. Imprima um espírito, um conceito, uma ideia, um "clima qualquer" ao seu negócio e é capaz de ele ser notado e consumido. O mundo (e entenda o termo "mundo" na proporção que bem entender, na figuração que desejar, como metáfora ou sujeito) só existe a rigor através das ideias. E em negócios este (e qualquer outro) conceito filosófico se aplica, uma vez que o mundo dos negócios nada mais é do que uma amostragem do mundo real, com suas contradições e virtudes, com suas injustiças, alegrias, ativos e demandas.


            Ao fazer negócio, não faça negócio. Produza significado. Ao liderar, imprima significado às tarefas delegadas à sua equipe. Ao vender, comunique significado na figuração de benefícios, e não apenas diga frases feitas como "este sai bastante". As pessoas começam a considerar lhe ouvir por um minuto quando elas percebem em você um "porta voz de algum significado". Com esse seu "esse sai bastante" você não vai "bater sua meta". A não ser que seu gerente tenha atribuído algum significado à tal "meta".


            Professores não dão aulas, eles produzem experiências de reflexão que significam sabedoria, auto-realização, crescimento existencial, alegria de viver. Jogadores de futebol nos apaixonam pelo significado do mito da vitória no ambiente mítico da competição. Talvez porque vistam uma camisa que os nossos pais nos ensinaram a amar, aquele escudo do time pelo qual torcemos sem saber direito por que. E nos comovemos com um filme pelo significado que contém. Quantas vezes usei a palavra significado nessa reflexão? Não contei. Se isso significar algo para você, conte. Senão, use o tempo para refletir: o que significa estar aqui agora? Fazer o que faço? Planejar e almejar o que sonho? O que a rigor significa o conjunto dos meus esforços e pensamentos? A quem eu importo? O que fazer da vida, do trabalho, do tempo, dada essa ideia?




* Eduardo Peres é mágico, humorista e palestrante para treinamento motivacional. Foi Campeão Mundial de Mágica em 2000. www.eduardoperes.com.br.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

O Marketing Pessoal como Índole


           Nos anos 80, a disseminação da ideia de "marketing pessoal" se tornou bastante popular. Livros e mais livros (em linguagem para não-acadêmicos) divulgavam a ideia da "auto-promoção". Era um elogio à promoção individual das pessoas, isto é, estender o conceito de "promoção" da esfera institucional para a esfera pessoal.

         Ocorre que o conceito era frequentemente minimizado e banalizado, a ponto de as pessoas considerarem ações de "marketing pessoal", tão somente como cuidados com a aparência física. Roupas, barba, maquiagem etc. Alguns iam brevemente além, e citavam detalhes de comportamento como etiqueta em reuniões, jantares, bons modos ao responder a e-mails, delicadeza ao abordar clientes etc. Sinceramente, isso é pouco. É necessário que pensemos o "marketing pessoal" de uma maneira mais profunda.

         A ideia é associá-lo à "comunicação da nossa índole". É evidente que o cuidado com a sua aparência comunica valor (roupas adequadas e limpas, higiene e bons modos etc.). Mas o que conta mesmo é a impressão que o cliente tem de você ao fazer uma conclusão de sua índole, isto é, da sua "inclinação de intenções", isto é, do seu anseio verdadeiro de ajudá-lo e de sinceramente servi-lo. Se o cliente percebe em você que a sua intenção prioritária é mecanicamente vender (visando apenas a sua comissão), que as suas opiniões são parciais e não sinceras, e que a intenção é a de que ele compre a qualquer custo, certamente ele não confiará em você. Mesmo que você esteja muito bem vestido e perfumado. Você será visto como um profissional de "índole egoísta", isto é, alguém que prioriza o seu próprio interesse em detrimento dos interesses do outro.

         De outro modo, caso você consiga no relacionamento com seu cliente comunicar a ele (com palavras, gestos, intenções e mesmo com o "estado de espírito da sua presença") que a sua intenção é verdadeiramente a de ajudá-lo, que o seu objetivo é o de servi-lo com real interesse na auto-realização dele; e sobretudo que a sua sincera e íntima missão é a de conduzi-lo a uma condição de satisfação e felicidade, certamente o relacionamento frutificará bons negócios. Você será percebido como um profissional de "índole altruísta", isto é, alguém que prioriza o interesse do outro, deixando os seus próprios interesses como mera consequência dos interesses dele, cliente. 

         Essa é a simples ideia desta reflexão. Aperfeiçoe seu marketing pessoal pela sua essência pessoal, e não apenas pela sua embalagem. Comunique valor através de seus gestos. Comunique sinceridade em seu interesse de servir seus clientes. Clientes amam ser servidos por quem ama servir. É humano. É mais bonito. E faz bem para os negócios.



* Eduardo Peres é mágico, humorista e palestrante para treinamento motivacional. Foi Campeão Mundial de Mágica em 2000. www.eduardoperes.com.br.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Japonesinho organizado


         O começo de uma nova temporada é um momento simbólico. É verdade que a vida segue sem pausas significativas em nossa respiração ou batimentos cardíacos, mas a marca de o fim de uma temporada anterior para o início de uma posterior (o réveillon ou a mudança de temporada profissional, por exemplo) sempre convida à reflexão e à reorganização de pensamentos e ambições. As famosas "resoluções de ano-novo" são um clássico dessa ideia. Difícil para muitos é tirá-las da intenção e fazê-las acontecer. Frequentemente, o "no próximo ano vou emagrecer, parar de fumar, estudar inglês e aprender a andar de bicicleta" viram "começo segunda que vem, depois do carnaval, das férias de julho, do rush de outubro" e a vida segue. Paciência.

         De todo modo, essa intenção traduzida como uma "vontade de potência" de início de temporada é muito estimulante, e podemos nos organizar para usá-la em nosso favor. E para evitar essa "humana, demasiado humana" procrastinação, um bom método é o bom e velho 5S. Este é um momento oportuno para relembrá-lo e implementá-lo não só em nossos negócios mas também na gestão da nossa vida pessoal.

         O "Programa 5S" é um conhecido e simples método de organização japonês, (usado por empresas que implementaram o oitentista "Plano de Qualidade Total"), mas que bem nos serve para a vida em geral. Como mágico e palestrante, vi nesses últimos quinze anos dezenas e dezenas de diferentes gibis ilustrados explicando o tal do 5S a funcionários de empresas - alguns muito bem feitos - e sempre me encantei com a simplicidade da ideia: cinco palavras em japonês que começam com a letra S, e que em português significam: Seleção, Arrumação, Limpeza, Padronização e Implementação. Ou coisa parecida. (Já vi diferentes traduções, essa me parece a mais coerente). Em brevíssimas palavras, imagine sua mesa de trabalho ou seu guarda-roupas e: elimine o que é inútil, dê aquela limpada boa, ponha cada coisa em seu lugar, defina normas para estabelecer que o que é usado volte facilmente ao mesmo lugar e avise todo mundo convencendo-os de que é uma boa todo mundo seguir o mesmo padrão. E só.

         Ainda em outras palavras: ponha sua vida em ordem neste início de temporada, para que seus planos maiores tenham condição de florescer. Ninguém faz sucesso nessa bagunça que está aí. Mais do que ter planos ou ambições, faça com que a ordem física e a padronização dos "processos" trabalhe por você também em sua vida pessoal. Na prática, doe as roupas que você não usou nos últimos seis meses (algumas exceções sentimentais estão permitidas), jogue fora aquela nota fiscal do vídeo cassete que você comprou em 1998 (e todos os outros papéis que estiverem da mesma cor), limpe o fundo das gavetas com Veja Multi-Uso (se precisar, troque o pano mas não perca o foco), defina novos lugares para os objetos que restarem nas "novas gavetas" que você ganhou, memorize o novo lugar de cada coisa e (por favor) procure manter a ordem de tudo nesse próximo ano. Aquele "acendeu apague, sujou limpe, usou guarde" realmente funciona. Para usar uma expressão atual, seja um "organizado sustentável". E avise o pessoal de casa que o cardápio da pizzaria agora fica na segunda gaveta da cozinha e "sempre lá". Outra coisa: use seu smartphone. Ele tem aplicativos "organizadores de vida" que são absolutamente geniais, mas que ninguém usa. Explore sua agenda, faça listas de tarefas com datas e prazos, ponha seus alarmes para apitar lhe cobrando das coisas importantes, esqueça um pouco o Facebook e faça acontecer o que é relevante para a sua biografia ao longo das simples tarefas do dia. Estamos conversados? Esse artigo mudou de tom. Mas a ideia é a mesma: resoluções de fim de ano acontecem tão somente com ações durante o ano. E o ano acontece todo dia. Um pouco por dia. Um dia de cada vez. Em suma, organize-se e faça o que tem de ser feito!



* Eduardo Peres é mágico, humorista e palestrante para treinamento motivacional. Foi Campeão Mundial de Mágica em 2000. www.eduardoperes.com.br